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A respeito da multiplicidade das cidades e do que é comum em todas as beagás:

I. Sociologia urbana

Para além das disfuncionalidades da fiação elétrica aérea, principalmente em relação à subterrânea, uma metrópole de céu cinzento, já arranhada cinzamente pelas concretudes verticalíssimas, é ainda retalhada — amei sua expressão — por chicotes negros; sim, chibatas, que castigam um céu já tão acinzentado, ou pior, acidentado pelo embate entre o tom mais sórdido e o ar mais tórrido.

Imagine só: o belorizontino, que de manhã polui seu ouvido de babosagem do noticiário, no almoço polui seu esofâgo de ultraprocessados, no trabalho polui suas mãos de graxa, na saída do trabalho polui suas vias áereas de carbono, ainda haverá de poluir suas retinas — já tão fatigadas — de fios que infestam o belorizonte.

II. Cidades invisíveis

Gostei da sua pergunta "em que lugar se encontram e o que é comum em todas as [belorizontes]?

Não sei se você o conhece e se já o leu, mas aqui gostaria de trazer dois trechinhos de duas das "Cidades Invisíveis", de Italo Calvino, para acrescentar às suas dúvidas — não tenho nada a acrescentar quando se trata de respostas :)

i. TAMARA

O olhar percorre as ruas como se fossem páginas escritas: a cidade diz tudo o que você deve pensar, faz você repetir o discurso, e, enquanto você acredita estar visitando Tamara [belorizonte], não faz nada além de registrar os nomes com os quais ela define a si própria e todas as suas partes.

ii. CLOÉ

Em Cloé [belorizonte], cidade grande, as pessoas que passam pelas ruas não se reconhecem. Quando se veem, imaginam mil coisas a respeito umas das outras, os encontros que poderiam ocorrer entre elas, as conversas, as surpresas, as carícias, as mordidas. Mas ninguém se cumprimenta, os olhares se cruzam por um segundo e depois se desviam, procuram outros olhares, não se fixam.

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Da sua reflexão sobre o romancear, penso em C.D.A, que teve uma vasta obra poética, mas não escreveu sequer um romance: o ineditismo do romance é um desafio homérico para um poeta de carreira que tem síndrome de autoliricismo. Penso, também como poeta, que o poema traz segurança: agasalha-nos em sua plena liberdade. O poemanárquico da nossa era literária é desamarrado, é irreverente, no sentido que contesta quaisquer regras que o burocratizem. Em contraste, o romance é o irmão que não pode ser pródigo, que tem que plantar direitinho para que a colheita seja proveitosa.

Outra coisa: por mais íntimo que seja um poema, penso que o romance é que desabotoa o que somos e nos desnuda para quem lê; afinal, personagens e estórias não seriam as outras faces das personas e histórias de nós mesmos?

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